Inspirado na viagem a Montevidéu
Autoria: Tainara de Souza Stumpf
Paulo caminhava pela 18 de Julio
sem pressa. Precisava comprar meias e luvas para sua filha Júlia e olhava as
vitrines na busca de seu objetivo. Quando cruzou na esquina da Rua Yi e viu a
bela Fonte dos Cadeados, resolveu aproximar-se.
Leu a placa da fonte: “La
leyenda de esta joven fuente dice que si se Le coloca un candado com las
iniciales de los personas que se aman, volveran juntas a visitarla y su amor
vivira por siempre...” Lembrou-se de
Carla. Em uma tarde gelada há muitos invernos atrás, viera até a fonte com a
sua namorada. Estava louco de paixão e queria demonstrar os seus sentimentos.
Ele comprou um cadeado e preparou-o
com as iniciais de seus nomes com o esmalte de unhas de sua mãe. Carla teria
uma grande surpresa. Convidou-a para passear no centro e visitar uma
confeitaria. Ao passarem pela fonte pararam para olhar os cadeados e Paulo
tirou o seu do bolso. Carla deu um grito de surpresa e prazer. Paulo convidou-a
a segurar o cadeado com ele e colocá-lo juntos na cerca da fonte. Após
prenderem o cadeado, o casal trocou o maior beijo do mundo.
Um fotógrafo que passava pela rua
resolveu registrar aquele momento. O casal não percebeu, pois ele estava do
outro lado da rua com uma câmera potente. Em seguida o fotógrafo atravessou a
rua e abordou-os quando eles já se deslocavam pela calçada. Ele pediu
autorização para expor a fotografia. Explicou que os rostos não haviam ficado
nítidos, que ele captou de uma grande distância. Os jovens autorizaram e anos
mais tarde Paulo viu em uma revista que a fotografia estava percorrendo o mundo
nas exposições de fotógrafos premiados pelas melhores imagens.
Agora ele procurava o cadeado que
eles colocaram na fonte naquele dia. Eram tantos, mal conseguia ver a delicada
cerca que protege a fonte. A água borbulhava como a dizer: mais para lá, mais para
cá. Finalmente ele achou. Estava bem enferrujado. Será que ainda abria aquele
cadeado? Lembrou que naquele dia disse à namorada que guardaria a chave no seu
coração. Colocou em uma caixa de sapatos onde guardava alguns documentos
importantes. Qualquer hora passaria para tentar abrir. Desta vez, não haverá
fotógrafos.
Cruzava com Carla de vez em quando,
nas ruas de Montevidéu. Esta cidade é uma pequena província, pensou ele. Viu uma vez ela com duas crianças a tiracolo.
Anos depois, ela caminhava com uma adolescente e uma criança menor. Sempre
sozinha. Engordou um pouco, perdeu o viço, mas ele também não era mais aquele
rapagão. Não estava ali procurando luvas e meias para Júlia?
Achava que Carla o perdoaria se
retirasse o cadeado. Precisava libertar aquele amor que rumou por caminhos
separados. E se a lenda da fonte estivesse certa? Ele e Carla ficariam juntos
de novo? Não, ele não queria mais. Agora estava feliz com a sua Eunice e a
pequena Júlia. Prepararia um cadeado e traria Eunice para fazerem o mesmo ritual.
A fonte agora parecia rir. A água
jorrava abundantemente e uma rajada de vento jogou algumas gotas no rosto de
Paulo. Ele saiu apressado e entrou na loja mais próxima para proteger-se do
frio.