sexta-feira, 24 de junho de 2016

A FONTE DOS CADEADOS


Inspirado na viagem a Montevidéu
Autoria: Tainara de Souza Stumpf
            
           Paulo caminhava pela 18 de Julio sem pressa. Precisava comprar meias e luvas para sua filha Júlia e olhava as vitrines na busca de seu objetivo. Quando cruzou na esquina da Rua Yi e viu a bela Fonte dos Cadeados, resolveu aproximar-se.           
             Leu a placa da fonte:  “La leyenda de esta joven fuente dice que si se Le coloca un candado com las iniciales de los personas que se aman, volveran juntas a visitarla y su amor vivira por siempre...”  Lembrou-se de Carla. Em uma tarde gelada há muitos invernos atrás, viera até a fonte com a sua namorada. Estava louco de paixão e queria demonstrar os seus sentimentos.            
          Ele comprou um cadeado e preparou-o com as iniciais de seus nomes com o esmalte de unhas de sua mãe. Carla teria uma grande surpresa. Convidou-a para passear no centro e visitar uma confeitaria. Ao passarem pela fonte pararam para olhar os cadeados e Paulo tirou o seu do bolso. Carla deu um grito de surpresa e prazer. Paulo convidou-a a segurar o cadeado com ele e colocá-lo juntos na cerca da fonte. Após prenderem o cadeado, o casal trocou o maior beijo do mundo.
            Um fotógrafo que passava pela rua resolveu registrar aquele momento. O casal não percebeu, pois ele estava do outro lado da rua com uma câmera potente. Em seguida o fotógrafo atravessou a rua e abordou-os quando eles já se deslocavam pela calçada. Ele pediu autorização para expor a fotografia. Explicou que os rostos não haviam ficado nítidos, que ele captou de uma grande distância. Os jovens autorizaram e anos mais tarde Paulo viu em uma revista que a fotografia estava percorrendo o mundo nas exposições de fotógrafos premiados pelas melhores imagens.
            Agora ele procurava o cadeado que eles colocaram na fonte naquele dia. Eram tantos, mal conseguia ver a delicada cerca que protege a fonte. A água borbulhava como a dizer: mais para lá, mais para cá. Finalmente ele achou. Estava bem enferrujado. Será que ainda abria aquele cadeado? Lembrou que naquele dia disse à namorada que guardaria a chave no seu coração. Colocou em uma caixa de sapatos onde guardava alguns documentos importantes. Qualquer hora passaria para tentar abrir. Desta vez, não haverá fotógrafos.
            Cruzava com Carla de vez em quando, nas ruas de Montevidéu. Esta cidade é uma pequena província, pensou ele.  Viu uma vez ela com duas crianças a tiracolo. Anos depois, ela caminhava com uma adolescente e uma criança menor. Sempre sozinha. Engordou um pouco, perdeu o viço, mas ele também não era mais aquele rapagão. Não estava ali procurando luvas e meias para Júlia?
            Achava que Carla o perdoaria se retirasse o cadeado. Precisava libertar aquele amor que rumou por caminhos separados. E se a lenda da fonte estivesse certa? Ele e Carla ficariam juntos de novo? Não, ele não queria mais. Agora estava feliz com a sua Eunice e a pequena Júlia. Prepararia um cadeado e traria Eunice para fazerem o mesmo ritual.
          A fonte agora parecia rir. A água jorrava abundantemente e uma rajada de vento jogou algumas gotas no rosto de Paulo. Ele saiu apressado e entrou na loja mais próxima para proteger-se do frio.

Um comentário: